André Vilaça, um dos ouvintes e contadores de histórias d'A História Devida, lançou no passado dia 3 de Dezembro o livro Contos Soltos, no qual está incluído o texto que nos enviou, «Conto do Autismo». O lançamento do livro do André aconteceu na Fnac do GaiaShopping e foi um sucesso. Deixamos aqui a história que o André partilhou connosco, esperando que fiquem com vontade de ler e comprar o livro. Basta visitarem o site da APPDA - Norte: http://www.appda-norte.org.pt/
Conto do Autismo
A minha personagem principal é um autista muito meigo e que sonha comer a maior bola de berlim do mundo. O seu nome é Lipinho, de Filipe.
Era uma segunda-feira no Centro de Actividades Ocupacionais da APPDA-Norte e ele estava na sua sala a ter a mesma vida de sempre quando aconteceu algo que mudou a sua vida. Entrou uma monitora nova. Era inglesa e vinha de Londres. Era muito bonita, tinha cabelos castanhos, olhos verdes e usava roupas desportivas. Ele sentiu algo que nunca sentira antes, mas eu sei o que é isso. Ele tentou arranjar umas palavras para lhe dizer, mas era muito difícil pois tinha de lutar contra o seu falar de repetir o que os outros diziam. Ela olhou para ele e deu-lhe um beijinho, dizendo «Olá Filipe.» «Olá Filipe?, repetiu ele. Desiludido, deixou cair a cabeça entre os dois braços e ficou todo o dia a olhar para ela.
Foram para o jardim e ele decidira dar-lhe algo. Mas o quê? De repente viu uma flor no relvado; era a única e foi buscá-la. Quando ia dá-la, o Herculano apareceu com um ramo de flores. A flor dele murchou… O seu melhor amigo, o único que gostava dele, era pela primeira vez seu rival e estava a roubar-lhe a miúda.
O Filipe estava na nossa sala e desviava o olhar sempre que a inglesa beijava o Herculano, porque eles namoravam. Então ele desistiu dela, pensando «Como seria possível uma rapariga apaixonar-se por um autista?»
Certo dia, quando cheguei ao centro, vi todos lá fora. Quando fui perguntar o que se passava disseram que metade do Centro estava a arder. Lá dentro todos fugiram da sala e a inglesa estava presa nos escombros a pedir ajuda. O Lipinho, ao ouvir os seus pedidos, voltou para trás, tirou as tábuas caídas da frente, pegou nela ao colo e saíu de lá. Ao sair do centro, pousou-a ao lado do Herculano. Ela abriu os olhos e agradeceu. Então ele disse pela primeira vez «De nada, foi um prazer.» Ela deu-lhe um beijo na face, ele ficou vermelho e logo pensou para si mesmo se ela deixaria o Herculano para ficar com ele. Mas isso não aconteceu.
O Filipe não se importou: tinha feito um acto corajoso e tinha falado sem repetir nada.
André Vilaça
Outras Histórias
Blogs dos nossos Contadores de Histórias